quarta-feira, 7 de novembro de 2018

X-Strahlen,123 anos depois




Röentgen (...)guardou segredo dizendo a um dos seus amigos,
Theodor Boveri: “descobri algo extraordinário, mas não sei se as 
minhas observações serão corretas”,e à sua mulher Bertha, 
afirmava que trabalhava numa coisa tão invulgar que diriam dele: 
“O Röentgen enlouqueceu!” (Eisenberg, 1995).
                        

            Não sabemos se existe alguma dramatização do que aconteceu, nada se sabe da heurística daquela pesquisa que a história da ciência arrumou em 8 de novembro de 1895. Sabemos que este fantástico achado, anunciado ao mundo em 28 de Dezembro de 1895, numa conferência pública e através do artigo Sobre uma nova espécie de raios (Über eine neue Art von Strahlen) teve uma descomunal repercussão. 

        Em poucas semanas, a notícia espalha-se pelo mundo, não só na comunidade científica como na imprensa mais generalista que noticiam os raios que deixam ver através da matéria. Apenas num mês, jornais como Diei Wiener Presse, de Viena (5 de janeiro de 1896); London Daily Chronicle, de Londres (6 de janeiro); Standard, de Londres (7 de janeiro); Le Matin, de Paris (13 de janeiro), e revistas científicas como The Electrician(10 de janeiro); LancetThe Brithish Medical Journal (11 de janeiro); Nature(16 de janeiro), além do próprio artigo original traduzido na Nature(23 de janeiro), fazem referência às photographias de Röntgen. Só em 1896 foram escritos 49 livros ou panfletos e 1000 artigos científicos sobre os raios X (Martins, 1997). Portugal não foge à regra e entre dezembro de 1895 e março de 1896 estão referenciadas cerca de 10 a 12 noticias em jornais generalistas e revistas científicas (Solano, 201  ).

            A repercussão imediata da descoberta dos raios de RÖNTGEN parece ser caso único na história da ciência. Em 1919, o eclipse solar que comprovou a teoria da relatividadede de Einstein é um rival de peso, a nível de repercussão na imprensa, mas que no meio científico não se consegue igualar.

            Em ciência não existem acasos. É hora de deixarmos de minimizar o mérito de Röntgen dando relevância ao aspeto acidental da observação do cientista. Essa é uma visão errada, como aliás vimos defendendo em publicações desde 2015. Quando se conhece um pouco do trajeto do cientista imediatamente nos apercebemos que estamos perante um espírito brilhante, perspicaz, rigoroso. Aos 50 anos, altura desta sua observação, Röntgen tem perto de 50 artigos publicados, essencialmente sobre as propriedades físicas dos cristais e sobre física aplicada. Por exemplo, em 1878 apresenta um alarme para telefone, em 1879 um barómetro. Um cientista experimentado, rigoroso nos detalhes e que escreve apenas três artigos sobre os raios X, tema que para ele estava esgotado. Na verdade, nos anos seguintes ninguém mais acrescentou nada ao tema.

            A descoberta de  Röntgen causou um grande impacto, não só nos meios científicos, mas entre a população em geral. Estava em cima da mesa algo que iria transformar a medicina. Iria tornar visível o invisível, tornar transparente o interior do corpo, ou como disse Castorp na Montanha Mágica, vermos aquilo que não devíamos ver, a nossa própria morte.

            Os primeiros aparelhos eram muito rudimentares e, mesmo assim, tornou-se comum a oferta de uma fotografia do torax, entre namorados, ou de radiografias da mão com um anel simbolizando o amor.

            Apenas depois de se perceber os efeitos nocivos da radiação X é que se restringiu o seu uso à medicina.
             A todos os TSDT de radiologia desejamos um bom 8 de novembro 2018.

"Ela é tão alta, tão esbelta; e seus ossos,
aqueles débeis fosfatos e aqueles carbonatos
tornam-se magníficos aos raios catódicos
pelas oscilações, ampères e ohms;
suas vértebras não se ocultam sob a pele,
mas tornam-se inteiramente visíveis.

Em torno de suas formosas costelas
em número de vinte e quatro
desenha-se um tênue halo de sua carne;
sua face sem nariz e sem olhos volta-se para mim
e eu sussurro: "querida eu te adoro";
seus dentes brancos e brilhantes sorriem.
Ah! doce, cruel, adorável catodografia"
                                                                       
Lawrence K. Russel, fevereiro 1896


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