A primeira Ordem que existiu, antes do Estado Novo, foi a dos
advogados. O Estado Novo, por conveniência e controlo de certos grupos, deu
espaço a que se concebessem outras Ordens, entre elas a dos médicos, e creio, a
dos arquitetos. Michael Foucault explica bem como todos os profissionais se tornaram atores na sociedade
vigilante, bem plasmada na sua obra Vigiar e Punir. Autores
incontornáveis sobre o tema, ORDENS e Cooperativismo, são Fernando Rosas,
Álvaro Garrido, Vital Moreira e Nuno Estevão, ou com publicações mais
especificas e com estudos de caso, Raquel Rego e João Freire, entre outros. Com
eles percebemos a origem, as razões porque o Estado Novo as defendeu e as
tornou panópticas das próprias profissões. Reside aqui, provavelmente, a minha
reserva quanto às ORDENS. Vital Moreira defende que as Ordens são uma criação
do ditador. Na verdade, e como já referimos, existe um caso, a ORDEM dos advogados, anterior aos
anos 30, mas é de Salazar o decreto que as legaliza e que as torna
equivalentes aos sindicatos, naquilo que diz respeito às profissões liberais (ver Garrido, Rego). Como é bom de ver, elas surgem como um correspondente
direto dos sindicatos e não outra coisa. Nem outro objetivo teve Salazar com a
sua criação.
Os tempos trazem alterações e à
conceção de ORDEM é associado um conjunto de outras valias que não as
sindicais, criando duas categorias autónomas e complementares. A segunda
metade do seculo XX e já este século XXI altera muito dos princípios que regem
as ordens, o mundo mudou, estas tornaram-se uma espécie de intervenientes e
fazedores de lobbys. Justificam muita da sua existência,
em diálogo com o Estado, substituindo-se às entidades reguladoras. Vendidas
como salvadoras e promotoras de tudo e mais alguma coisa, vivem entre
reivindicações e ameaças, quando apenas, e bastas vezes, não são mais do que
déspotas em relação a algumas regalias que os seus membros possam ter e que de
outro modo jamais as teriam. Tornaram-se, igualmente, uma passerelle de vaidades e disputas de grandes
egos, onde nem sempre são eleitos os mais capazes. Outras vezes, as eleições são
por magríssima representação tal os níveis de absentismo, criando verdadeiro
espaço para o distanciamento entre a realidade dos profissionais e a realidade
da ORDEM. Palcos partidários e submersas em jogos, nem sempre
defendendo os associados, mas antes defendendo o poder de alguns. Criado um
espaço próprio para não colidirem com os sindicatos elaborou-se uma ideia de
entidades distintas, aliadas do poder politico e institucional, as ORDENS
surgem como as defensoras da sociedade civil dos próprios profissionais,
dando origem a estatutos, regulamentos e desvios à sua ideia inicial. O
que deixa tantas vezes caminho aberto para alguma criatividade nem sempre muito
entendível, e por outro lado, alguns dos seus principais atores
deixam-se contaminar por ideias reivindicativas confundindo os receptores com
as suas ações.
São uma construção/prática sociológica com
função aglutinadora, que a qualquer dia pode ser substituída por outra
entidade, desde que aliada do estado e não rival do estado, correndo o risco,
caso seja este o caminho, de se tornarem desnecessárias.
Mesmo assim, elas surgem como "fim de linha", obrigatórias para sobrevivermos e nos afirmarmos.
Como jogar neste tabuleiro entre
profissões senão nos munirmos com as mesmas armas? A pergunta não é se devemos
ter uma ORDEM (se não podes nada contra eles tens que te reforçar com as mesmas
armas), antes como nos gerimos como grupo pobre (muito pobre) e heterogéneo
debaixo de um chapéu de ação tão elástica, diversa e de custos tão elevados? Como processar uma ORDEM tão
aglutinadora como neste momento se tornou o sindicato e não um depósito mensal
de uma verba obrigatória e com a qual quase ninguém tem a ver?
Rego, R. 2007. Dirigentes associativos: envolvimento e profissionalização.
Rodrigues,M.L.1997.Sociologia das profissões, Oeiras.
http://www.oa.pt/upl/%7Bdbda350c-7e53-44b3-a4d8-14c7ffcac800%7D.pdf
https://www.publico.pt/2017/09/09/sociedade/opiniao/as-ordens-profissionais-nao-podem-substituirse-a-governacao-do-pais-1784810
https://www.publico.pt/2017/09/09/sociedade/opiniao/as-ordens-profissionais-nao-podem-substituirse-a-governacao-do-pais-1784810
Sem comentários:
Enviar um comentário